quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Instruções sobre a Forma Extraordinária - Parte I


Introdução.
Nesta apostila vamos seguir o que diz o Papa Pio XII na “Instrução sobre Música Sacra e Sagrada Liturgia”, de 3 de setembro de 1958. Este é o último documento que trata sobre o assunto até o ano de 1962.

1) Noções prévias.
A Santa Missa pode ser:
a) Missa Pontifical: é a Missa celebrada pelo Bispo. Esta pode ser:
·         Solene: celebrada com canto e ministros sagrados.
·         Rezada: sem canto com a ajuda de dois Sacerdotes Capelães (mesmas normas de participação da Missa dialogada ou rezada pelo sacerdote).
            b) Missa com canto: quando o Sacerdote canta as partes que lhe são próprias. Subdivide-se em:
·         Solene: quando o Sacerdote é ajudado pelo Diácono e Subdiácono;
·         Cantada (de guardião): quando o Sacerdote é ajudado só por acólitos.
c) Missa Dialogada: quando os fiéis participam liturgicamente, ou seja, respondendo ao Celebrante e rezando com ele o Gloria, Credo, Sanctus e Agnus Dei.
d) Missa Rezada: quando os fiéis participam em silêncio ou em comum por meio de orações e cânticos de piedade popular (extra-litúrgicos).

2) Participação dos fiéis nas Missas com canto.
            Na Missa Solene a participação ativa dos fiéis pode realizar-se em três graus:
            a) Primeiro grau: Quando todos os fiéis cantam as respostas litúrgicas: Amen; Et cum spiritu tuo; Gloria Tibi, Domine; Habemus ad Dominum; Dignum et iustum est; Sed libera nos a malo; Deo gratias. Deve-se trabalhar para que em todos os lugares os fiéis sejam capazes de cantar essas repostas.
            b) Segundo grau: Quando todos os fiéis cantam as partes do Ordinário da Missa: Kyrie, Gloria, Credo, Sanctus e Agnus Dei. Deve-se esforçar para que os fiéis saibam a cantar essas partes da Missa com as melodias gregorianas mais simples.
            c) Terceiro grau: Quando todos os presentes estejam de tal modo exercitados no canto gregoriano, que saibam cantar as partes do Próprio da Missa. Deve-se urgir essa participação plena sobretudo nas comunidades religiosas e seminários.
            Nos domingos e festas deve-se optar (optandum est) para que a Missa paroquial ou principal seja celebrada com canto.
            Para as Missas cantadas, aplicam-se as mesmas normas de participação da Missa solene.

3) Participação dos fiéis nas Missas rezadas.
            O primeiro modo com o qual os fiéis podem participar da Missa rezada dá-se quando, cada um, por própria indústria, participa internamente, ou seja, com atenção às partes principais da Missa, ou externamente, segundo os costumes aprovados das diversas regiões.
São principalmente dignos de louvor os que, com um pequeno missal adaptado à sua capacidade, rezam com o Sacerdote as mesmas orações da Igreja. Como, porém, nem todos os fiéis são igualmente idôneos para entender os ritos e fórmulas litúrgicas, estes podem participar de um modo mais apto e fácil, ou seja “meditando piamente nos mistérios de Jesus Cristo, ou fazendo exercícios de piedade e orações que, embora difiram da forma dos ritos sagrados, no entanto pela sua natureza a eles convém.[1]
            O segundo modo de participação dá-se quando os fiéis participam da Santa Missa com orações comuns e cânticos. Deve-se cuidar para que tais orações e cânticos estejam de acordo com as diversas partes da Missa.

O terceiro modo de participação e o mais perfeito de todos, dá-se quando os fiéis respondem liturgicamente ao Celebrante, como que dialogando com ele e rezando em voz alta as partes que lhes são próprias. Esta participação plena se distingue em quatro graus:
            a) Primeiro grau: se os fiéis dão ao Celebrante as respostas mais fáceis: Amen; Et cum spiritu tuo...
            b) Segundo grau: se os fiéis dizem todas as respostas do acólito, rezam o Confiteor antes da comunhão e o Domine non sum dignus.
            c) Terceiro grau: se os fiéis rezam com o Celebrante as partes do Ordinário da Missa: Kyrie, Gloria, Credo, Sanctus e Agnus Dei.
            d) Quarto grau: se os fiéis rezam juntamente com o Celebrante as partes do Próprio da Missa: Intróito, Gradual, Ofertório e Comunhão. Este último grau pode ser usado com dignidade por grupos mais seletos e cultos.
            Outras normas:
            Nas Missas rezadas, todo o Pater Noster pode ser rezado pelos fiéis juntamente com o Celebrante, mas somente em língua latina, e acrescentando o Amen. Em razão do costume, enquanto o Celebrante reza o Pai Nosso em latim, os fiéis podem rezá-lo juntos em português.
            Nas Missas rezadas os fiéis podem cantar hinos populares, guardando-se, porém, a lei de que estejam de acordo com cada parte da Missa.


4) Posições dos fiéis na Santa Missa.

Partes da Cerimônia
Missa Rezada
Missa Dialogada
Missa Cantada e Solene
Missa Pontifical
Recepção do Bispo (Ecce Sacerdos)
De joelhos
De joelhos
De joelhos
De joelhos
Entrada do Celebrante
De pé
De pé
De pé
De pé
Canto do Asperges
De pé
De pé
De pé
De pé
Orações ao pé do altar
De joelhos
De joelhos
De pé
De pé
Ao subir ao altar
De joelhos
De pé
De pé
De pé
Incensação
-
-
De pé
De pé
Intróito e Kyrie
De joelhos
De pé
De pé
De pé
Gloria
De joelhos
De pé
De pé/sentados
De pé/sentados
Colecta (oração do dia).
De joelhos
De pé
De pé
De pé
Epístola
Sentados
Sentados
Sentados
Sentados
Gradual/Aleluia
Sentados
Sentados
Sentados
Sentados
Evangelho
De pé
De pé
De pé
De pé
Credo
De pé
De pé
De pé/sentados
De pé/sentados
Et incarnatus est
Genuflexão
Genuflexão
De joelhos
De joelhos
Dñus. vob./Oremus
De pé
De pé
De pé
De pé
Ofertório
Sentados
Sentados
Sentados
Sentados
Incensação do Celebrante
-
-
De pé
De pé
Orate fratres
De pé
De pé
De pé
De pé
Após o Sanctus (rezado ou cantado)
De joelhos
De joelhos
De joelhos
De joelhos
Todo o Cânon
De joelhos
De joelhos
De joelhos
De joelhos
Pater Noster/Agnus Dei
De joelhos
De pé
De pé
De pé
Após o Agnus /comunhão
De joelhos
De joelhos
De joelhos
De joelhos
Abluções até Communio
De joelhos
De joelhos
De pé
De pé
Postcommunio
De joelhos
De pé
De pé
De pé
Bênção final
De joelhos
De joelhos
De joelhos
De joelhos
Evangelho final
De pé
De pé
De pé
De pé
Orações finais/pé do altar
De joelhos
De joelhos
-
-
Saída do Celebrante
De pé
De pé
De pé
De joelhos

Exceção: nos dias de penitência (advento, quaresma), salvo no domingo, e nas Missas de defuntos, deve-se ajoelhar durante a Colecta e a Postcommunio.


[1]Encíclica Mediator Dei.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Método curto e devoto, para assistir com fruto à Santa Missa

(São Leonardo de Porto-Maurício, As Excelências da Santa Missa)


Era opinião de São João Crisóstomo, opinião aprovada e confirmada por Gregório, no quarto de seus Diálogos, que, no momento em que o padre celebra a Missa, os céus se abrem, e multidões de Anjos descem do Paraíso para assistir ao santo Sacrifício. São Nilo abade, discípulo do mesmo São Crisóstomo, afirma que via, quando este santo doutor celebrava, uma grande multidão daqueles espíritos celestes assistindo os ministros sagrados em suas augustas funções.
Eis o meio mais adequado para assistir com fruto à Santa Missa: consiste em irdes à Igreja como se fôsseis ao Calvário, e de vos comportardes, diante do altar, como o faríeis diante do trono de DEUS, em companhia dos Santos Anjos. Vede, por conseguinte, que modéstia, que respeito, que recolhimento são necessários para receber o fruto e as graças que DEUS costuma conceder àqueles que honram, com sua piedosa atitude, mistérios tão santos.

Entre os hebreus, enquanto se celebravam os sacrifícios da antiga Lei, nos quais se ofereciam apenas touros, cordeiros e outros animais, era coisa digna de admiração ver com quanto recolhimento, modéstia e silêncio o povo todo acompanhava. E, se bem que o número de assistentes fosse incalculável, além dos setecentos ministros que sacrificavam, parecia, no entanto, que o templo estava vazio, pois não se ouvia o menor ruído, nem um sopro. Ora, se havia tanto respeito e veneração por esses sacrifícios que afinal, não eram mais que uma sombra e figura do nosso, que silêncio, que atenção, que devoção não merece a Santa Missa, na qual o próprio Cordeiro Imaculado, o Verbo de DEUS, se imola por nós?! Bem o compreendia Santo Ambrósio.

No testemunho de Cesário, quando ele celebrava a Santa Missa, após o Evangelho virava-se para o povo e o exortava a um piedoso recolhimento e impunha a todos guardar o mais rigoroso silêncio, não só proibindo a menor palavra, mas ainda abstendo-se de tossir ou fazer qualquer ruído. E era obedecido. Quem quer que assistisse à Santa Missa do santo Bispo, sentia-se tomado de profundo respeito e comovido até ao fundo da alma, tirando assim grande proveito e acréscimo de graças.

VÁRIOS MÉTODOS PARA ASSISTIR À SANTA MISSA
O desígnio exclusivo do presente opúsculo é levar aqueles que o quiserem ler, a adotar com fervo um método de assistir à Santa Missa, conforme vou expor. Como, porém, muitas maneiras de assistir à Missa, todas louváveis e santas, têm sido ensinadas até hoje, não tenho a intenção de impor-vos a minha. Deixo-vos, portanto, a liberdade de escolher aquele modo que mais vos agradar e vos parecer mais conforme a vossa devoção e capacidade, e farei junto de vós apenas o ofício de Anjo da guarda, propondo-vos o método mais frutuoso, quero dizer, o que, a meu humilde julgamento, poderá ser para vós mais vantajoso e fácil.

Neste fim, distinguimos três classes de métodos.

O primeiro é o das pessoas que, de livro à mão, seguem atentamente todas as ações do sacerdote, a cada um recitam outra prece vocal que lêem no livro, e assim passam todo o tempo da Missa a ler. Não há dúvida que, se a essa leitura se junta a meditação dos grandes mistérios, é uma excelente maneira de assistir ao santo Sacrifício; e produz também grandes frutos.

Visto, porém, exigir atenção excessiva, pois é necessário seguir todas as cerimônias que o sacerdote efetua, e em seguida dirigir os olhos ao livro para aí ler a oração correspondente, torna-se uma prática algo fatigante, na qual poucas pessoas, creio, hão de persistir, dada a fraqueza do nosso espírito que se enfada facilmente de refletir sobre tantas ações diversas que o sacerdote executa no altar.

Enfim, aquele que se acha bem assim e tira proveito espiritual, continue a seguir este sistema; pois à prática tão laboriosa não faltará uma recompensa da parte de DEUS.

A segunda maneira de assistir à Santa Missa é a das pessoas que não se servem de livros e não lêem absolutamente nada durante todo o tempo do santo Sacrifício, mas que, com viva fé, fixam os olhos da alma em JESUS crucificado, e, apoiados na árvore da Cruz, dela recolhem os frutos por meio de doce contemplação. Passam todo esse tempo em piedoso recolhimento interior e na consideração dos sagrados mistérios da Paixão de JESUS CRISTO, que são não somente representados, mas misticamente reproduzidos na Santa Missa.

É certo que estas pessoas, mantendo suas almas assim recolhidas em DEUS, exercem atos heróicos de Fé, de Esperança e de Caridade e de outras virtudes, e não há duvida que esta maneira de assistir à Santa Missa é muito mais perfeita que a primeira, e também mais doce e mais suave, como o atesta a experiência de um bom irmão converso.

Costuma ele dizer que, ao assistir à Santa Missa, não lia mais que três letras: a primeira, negra, era a consideração de seus pecados que lhe produziam confusão e arrependimento, e ocupava-o desde o começo até ao ofertório. A segunda era vermelha: a meditação da Paixão de CRISTO, na qual considerava o preciosíssimo Sangue que JESUS derramou por nós no Calvário, sofrendo morte tão cruel; nisto se entretinha até à Comunhão.

A terceira letra era branca pois quando o sacerdote comungava, ele se unia a JESUS pela comunhão espiritual, ficando, em seguida, todo absorto em DEUS, contemplando a glória eterna que esperava como fruto do divino Sacrifício.

Esse homem simples assistia à Santa Missa com grande perfeição e quisera eu que todos aprendessem dele tão alta sabedoria.

Trecho do Livro “As Excelências da Santa Missa” - São Leonardo de Porto-Maurício – páginas 41-44.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Mitos litúrgicos - Parte IV (Final)

Mito 25: “Cada comunidade deve ter a Missa do seu jeito”

Não deve e não pode ter a Missa do seu jeito, e sim do jeito católico.

O Concílio Vaticano II já dizia (Sacrossanctum Concilium, 22): “Ninguém mais, absolutamente, mesmo que seja sacerdote, ouse, por sua iniciativa, acrescentar, suprimir ou mudar seja o que for em matéria litúrgica.”

Escreveu o saudoso Papa João Paulo II : (Ecclesia de Eucharistia, n. 52) “Atualmente também deveria ser redescoberta e valorizada a obediência às normas litúrgicas como reflexo e testemunho da Igreja, una e universal, que se torna presente em cada celebração da Eucaristia. O sacerdote, que celebra fielmente a Missa segundo as normas litúrgicas, e a comunidade, que às mesmas adere, demonstram de modo silencioso mas expressivo o seu amor à Igreja. (…) A ninguém é permitido aviltar este mistério que está confiado às nossas mãos: é demasiado grande para que alguém possa permitir-se de tratá-lo a seu livre arbítrio, não respeitando o seu caráter sagrado nem a sua dimensão universal.”

Também a Instrução Inaestimabile Donum, de 1980, afirma: “Aquele que oferece culto a Deus em nome da Igreja, de um modo contrário ao qual foi estabelecido pela própria Igreja com a autoridade dada por Deus e o qual é também a tradição da Igreja, é culpado de falsificação.”

O Cardeal Ratzinger, hoje Papa Bento XVI, afirmou: “É preciso que volte a ser claro que a ciência da liturgia não existe para produzir constantemente novos modelos, como é próprio da indústria automobilística. (…) A Liturgia é algo diferente da invenção de textos e ritos, porque vive, precisamente, do que não é manipulável.” (“O Sal da Terra”)

Mitos litúrgicos - Parte III

Mito 15. “O Ministério extraordinário da Sagrada Comunhão existe para promover a participação dos leigos.”

Não existe para isso, pois ordinariamente a função do leigo não é distribuir o Corpo de Deus.

Isso afirma expressamente a Instrução Redemptionis Sacramentum (n. 151): “Somente em caso de verdadeira necessidade se deverá recorrer à ajuda dos ministros extroardinários na celebração da liturgia. De fato, isto não está previsto para assegurar a participação mais plena dos leigos, mas é por sua natureza supletivo e provisório.”

O ministro ordinário da Comunhão Eucarística, pela unção do Sacramento da Ordem, é o sacerdote e o diácono (Cânon 910). Por isso, ordinariamente somente eles podem ministrar a Corpo de Nosso Senhor.

Havendo real necessidade, o ministro extraordinário pode distribuir a Comunhão Eucarística. Os ministros extraordinários são prioritariamente os acólitos instituídos (cânon 910). Não havendo acólitos instituídos disponíveis para isso, outros fiéis (religiosos ou leigos) podem atuar ministrando a Comunhão Eucarística, como aponta a Instrução Redemptionis Sacramentum (n. 155) Tais situações são, de fato, extraordinárias, como o próprio nome do ministério já o indica.

Portanto, é um equívoco afirmar que o Ministério Extraordinário da Comunhão Eucarística existe para promover o serviço do leigo, pois esta função não é, ordinariamente, uma atribuição do leigo, e em uma situação em que houvesse um número maior de ministros ordinários o ministério extraordinário não haveria razões para existir.

Quais seriam estas razões que indicariam esta “verdadeira necessidade” para o uso dos ministros extraordinários da Comunhão Eucarística? A própria Instrução responde: “O ministro extraordinário da sagrada Comunhão poderá administrar a Comunhão somente na ausência do sacerdote ou diácono, quando o sacerdote está impedido por enfermidade, idade avançada, ou por outra verdadeira causa, ou quando é tão grande o número dos fiéis que se reúnem à Comunhão, que a celebração da Missa se prolongaria demasiado. Por isso, deve-se entender que uma breve prolongação seria uma causa absolutamente suportável, de acordo com a cultura e os costumes próprios do lugar.” (n. 158) E ainda: “Reprove-se o costume daqueles sacerdotes que, apesar de estarem presentes na celebração, abstém-se de distribuir a Comunhão, delegando esta tarefa a leigos.” (n. 157)

Mitos litúrgicos - Parte II

Mito 7: “Quem celebra a Missa não é o Padre, e sim toda a comunidade”

A Instrução Redemptions Sacramentum (n. 42), de 2004, discorrendo sobre o Santo Sacrifício da Missa, afirma: “O Sacrifício Eucarístico não deve, portanto, ser considerado “concelebração”, no sentido unívoco do sacerdote juntamente com povo presente. Ao contrário, a Eucaristia celebrada pelos sacerdotes é um dom que supera radicalmente o poder da assembléia. A assembléia, que se reúne para a celebração da Eucaristia, necessita absolutamente de um sacerdote ordenado que a presida, para poder ser verdadeiramente uma assembléia eucarística. Por outro lado, a comunidade não é capaz de dotar-se por si só do ministro ordenado.”

Mitos litúrgicos - Parte I

Trago para o blog um texto de grande valia para uma sadia compreensão da Liturgia: é um texto sobre afirmações erroneamente tidas como verdadeiras por não poucos católicos, acerca da Sagrada Liturgia. O texto é de autoria de Francisco Dockhorn, do Apostolado Reino da Virgem Mãe de Deus, e foi publicado em 2009 e contou com a revisão teológica de um sábio bispo, Dom Antônio Carlos Rossi Keller, da Diocese de Frederico Westphalen, no Rio Grande do Sul. Comecemos então com a primeira parte do texto:

Quando eu era criança, tínhamos na creche que eu freqüentava a “hora do conto”, onde se contavam estórias sobre lendas infantis, como: chapeuzinho vermelho, lobo mau, branca de neve, sete anões, João e Maria, três porquinhos, Cinderela, Saci-Pererê, etc.

Infelizmente, tenho visto que muitos escritos sobre Liturgia editados no Brasil e muitos cursos de Liturgia ao nosso redor tem se tornado uma “hora do conto”, onde se ensina mitos que não correspondem à verdade da doutrina e da disciplina da Santa Igreja Católica Apostólica Romana.

Não me refiro, evidentemente, à má intenção de quem promove ou ministra tais cursos, pois isto não cabe a mim julgar. A avaliação que faço aqui é puramente a nível de conteúdo.

Vejo que é freqüente se ensinar mitos como: “A Presença de Jesus na Palavra é tão completa como na Eucaristia; a Eucaristia é para ser comida e não para ser adorada; a adoração eucarística fora da Missa é ultrapassada; na consagração deve-se estar em pé; a noção da Missa como Sacrifício é ultrapassada; é mais expressivo no altar a imagem de Jesus Ressuscitado do que de Jesus crucificado; quem celebra a Missa não é o Padre, e sim toda a comunidade; a Igreja pode vir a ordenar mulheres; a Missa é para os fiéis; não se assiste à Missa; qualquer pessoa pode comungar; a absolvição comunitária substitui a confissão individual; é errado comungar na boca e de joelhos; a comunhão tem que ser em duas espécies; o Ministério extraordinário da Sagrada Comunhão existe para promover a participação dos leigos; o cálice e o cibório podem ser de qualquer material; os fiéis podem rezar junto a doxologia e a oração da paz; o sacerdote usar casula é algo ultrapassado; o Concílio Vaticano II aboliu o latim; para participar bem da Missa é preciso entender a língua que o padre celebra; o canto gregoriano é algo ultrapassado; atualmente o padre tem que rezar de frente para os fiéis; o Sacrário no centro é anti-litúrgico; não se deve ter imagens dos santos nas igrejas; cada comunidade deve ter a Missa do seu jeito; pode-se fazer tudo o que o Missal não proíbe; o padre é autoridade, por isso deve-se obedecê-lo em tudo; procurar obedecer à leis é farisaísmo; o que importa é o coração; a Missa Tridentina é antiquada; para celebrar a Missa Tridentina é preciso autorização do Bispo local; ir à Missa dominical não é obrigação.”

A diferença entre tais idéias e o autêntico pensamento católico é facilmente constatada, confrontando estes mitos aos documentos oficiais da Santa Igreja editados em Roma. São idéias que, evidentemente, não surgiram ao acaso, mas são fruto direto ou influência de uma teologia litúrgica modernista e incompatível com a autêntica teologia católica. Aqui na América Latina, muitas delas foram historicamente reforçadas pela disseminação de teologias importadas e da chamada “Teologia da Libertação”, esta de caráter marxista, que é incompatível com o pensamento da Santa Igreja e faz uma releitura de toda teologia (inclusive da teologia litúrgica), como está expresso em diversos documentos do Sagrado Magistério (ver a “Instrução sobre alguns aspectos da Teologia da Libertação”, da Sagrada Congregação para Doutrina da Fé, de 06 de Agosto de 1984).

O objetivo deste artigo é expor abaixo cada um desses mitos litúrgicos citados e os contrapor com a palavra oficial da Santa Igreja. Todas as citações utilizadas sobre disciplina litúrgica, de documentos da Santa Igreja, se aplicam à forma do Rito Romano aprovada pelo Papa Paulo VI (que é atualmente a forma ordinária), com exceção dos mitos 30 e 31, que falam expressamente sobre a Missa Tridentina, que é a forma tradicional e (atualmente) extraordinária do Rito Romano.

Vamos aos mitos listados (32, ao todo) e suas contra-argumentações:

Mito 1: “A Presença de Jesus na Palavra é tão completa como na Eucaristia”

Não é.

Ensina-nos o Sagrado Magistério da Santa Igreja Católica Apostólica Romana que Nosso Senhor Jesus Cristo está presente verdadeiramente e substancialmente no Santíssimo Sacramento do Altar, em Corpo, Sangue, Alma e Divindade, nas aparências do pão e do vinho, como afirma o Catecismo da Igreja Católica (Cat.), nos números 1374-1377.

E por na Hóstia Consagrada Nosso Senhor está presente de maneira substancial, o Papa Paulo VI afirma (Encíclica Mysterium Fidei, n. 40-41, de 1965) a supremacia da Presença Eucarística de Nosso Senhor sobre as demais formas de presença:

“Estas várias maneiras de presença enchem o espírito de assombro e levam-nos a contemplar o Mistério da Igreja. Outra é, contudo, e verdadeiramente sublime, a presença de Cristo na sua Igreja pelo Sacramento da Eucaristia. Por causa dela, é este Sacramento, comparado com os outros, “mais suave para a devoção, mais belo para a inteligência, mais santo pelo que encerra”; contém, de fato, o próprio Cristo e é “como que a perfeição da vida espiritual e o fim de todos os Sacramentos”. Esta presença chama-se “real”, não por exclusão como se as outras não fossem “reais”, mas por antonomásia porque é substancial, quer dizer, por ela está presente, de fato, Cristo completo, Deus e homem.”

Também o próprio Concílio Vaticano II, na Constituição Sacrosanctum Concilium (n.7), afirma esta supremacia da Presença Eucarística: “Para realizar tão grande obra, Cristo está sempre presente na sua igreja, especialmente nas ações litúrgicas. Está presente no sacrifício da Missa, quer na pessoa do ministro – «O que se oferece agora pelo ministério sacerdotal é o mesmo que se ofereceu na Cruz» – quer e SOBRETUDO sob as espécies eucarísticas.”

Afirmar que a presença de Nosso Senhor na Palavra é tão completa como na Hóstia consagrada significa uma dessas duas coisas: afirmar que Nosso Senhor se transubstancia na Palavra (aí fazemos o que, comemos a Bíblia e o Lecionário?), ou negar a Presença Substancial de Nosso Senhor na Hóstia Consagrada, o que atenta conta o Mistério central da fé católica, pois a Eucaristia é “fonte e ápice da vida cristã” (Lumen Gentium, n.11)